sábado, 3 de setembro de 2016

APRESENTANDO-NOS COMO SACRIFÍCIO VIVO E NÃO NOS CONFORMANDO COM ESTE MUNDO

“Rogo-vos pois, irmãos, pelas misericórdias de Deus que apresenteis o vosso corpo por sacrifício vivo, santo e agradável a Deus, que é o vosso culto racional. E não vos conformeis com este século, mas transformai-vos pela renovação da vossa mente, para que experimenteis qual seja a boa, agradável e perfeita vontade de Deus.  Porque pela graça que me é dada, digo a cada um dentre vós que não pense de si mesmo além do que convém; antes, pense com moderação, conforme a medida da fé que Deus repartiu a cada um. (Romanos 12:1-2)

Na sequência de sua explanação sobre o evangelho de Deus na carta aos Romanos, Paulo faz um pedido, na verdade, ele roga, para que possamos, a partir do conhecimento dessas boas novas, que expressam de forma prática as misericórdias de Deus, que nos apresentemos a Deus e não nos conformemos com este mundo. Esse procedimento é o que nos capacitará a seguirmos adiante. Não adianta apenas compreendermos o que Deus fez por nós e Suas misericórdias aplicadas sobre nossas vidas. Aliás, fica muito evidente que Paulo está dizendo que, uma vez que Deus foi tão misericordioso, e misericórdia aqui fala, claramente, de Deus ter se compadecido de nossa miséria (como sugere a palavra original), devemos agora viver para ele, nos apresentarmos como um sacrifício vivo, santo e agradável a Deus.
Mas, como é isso na prática? O que é nos apresentarmos a Deus como sacrifício vivo e não nos conformarmos com esse mundo? Em primeiro lugar, é necessário entendermos que a palavra conformar neste versículo significa tomar a forma. A ideia é aquele brinquedo de massinha, das crianças. A massinha toma a forma que a criança deseja que ela tome a partir de um molde e Paulo, ao utilizar essa palavra, dá a ela o mesmo sentido. É não tomarmos a forma deste século ou, em outras traduções, deste mundo, que é um molde que tenta nos fazer idênticos a todos os que o servem.
Gostaria de tentar mostrar com um exemplo bíblico como é, de forma prática, nos oferecermos como sacrifício, não nos conformarmos com este mundo e termos nossas mentes renovadas, que é o outro ponto. O cristão precisa ter sua mente renovada, pois, desde que nascemos, temos sido bombardeados com os princípios, tradições e regras deste mundo, que premia o egocentrismo, ou seja, uma vida onde tudo gira em torno de nós mesmos. O personagem que, para mim, expressa de maneira clara essa verdade é Moisés. Sua trajetória mostra como Deus trabalhou todos esses passos em sua vida.


1º Passo: Moisés oferecendo-se a Deus
Todos os leitores da Bíblia conhecem a história de Moisés, que está registrada no livro de Êxodo, por isso não acho necessário que a contemos aqui.  O fato é que Romanos 12:1-3 pode ser visto, em todos os seus momentos na vida desse servo de Deus. O primeiro ponto é que nós devemos nos oferecer a Deus. Ouvi, certa vez, um irmão usar a seguinte expressão “Deus é um cavalheiro, ele não força ninguém a fazer coisa alguma” e creio que esse pensamento seja verdadeiro em certo sentido. É claro que toda a vontade de Deus será feita neste universo, mas Ele não violenta o livre arbítrio que Ele mesmo deu ao homem. Por isso muitos se perdem, por não desejarem servi-lo e mesmo os que creem, Deus não os força a obedecê-lo, o que só fazemos por amor a Ele e sempre impulsionados por sua graça, que nos capacita.
A história de Moisés começa com um ato de fé de seus pais, não permitindo que ele fosse morto ao nascer, conforme era a ordem de faraó. Ele foi escondido por eles e, depois, como sabemos, foi colocado na água, “encontrado” pela filha da filha de Faraó, devolvido aos seus pais, por causa da esperteza de sua irmã, onde ficou até ser desmamado. Creio que nesse período, Moisés recebeu as informações necessárias para saber da vontade de Deus de libertar Seu povo. Quando pensamos em uma criança ser desmamado, na nossa cultura, pode ser até os dois anos de idade, porém, na cultura hebréia, isso acontecia com a criança bem mais velha, o que daria condições aos seus pais de instruí-lo nessa verdade.
Moisés cresceu sabendo que Deus haveria de libertar seu povo da servidão do Egito e, mais ainda, que Ele o faria pelas suas mãos (Atos 7:25). Por isso ele mata o egípcio que maltratava seus irmãos. Esse é o primeiro ponto, Moisés oferecendo-se a Deus. Ele sabia que o Senhor faria algo com relação ao Seu povo e queria ser instrumento nas mãos de Deus, assim oferece a Ele o que tem, embora isso se mostre totalmente inadequado. Ao tentar servir a Deus, oferecendo-se a Ele, Moisés comete um assassinato. Do ponto de vista humano, pode-se dizer que esse seria o fim da experiência de Moisés. Deus usaria um assassino? Talvez, se eu fosse Deus, diria a Moisés “você não entendeu nada, Moisés. Ao invés de me deixar fazer tudo, você agiu por conta própria e fez uma grande bobagem. É o fim, vou escolher outro”. Porém, glória a Deus, não somos como Deus e Ele não é como nós.
Nesse fato, na verdade, está o início para Moisés, pois Deus recebe sua oferta. A oferta de si mesmo para servi-lo e libertar o Seu povo. É como se o Senhor dissesse “muito bem, Moisés, você quer me seguir, mas não sabe como fazê-lo, pois os seus caminhos são bem diferentes dos meus e seus métodos totalmente inadequados. Mas eu aceito sua oferta. Agora vou fazer como deve ser feito”.
No dia seguinte, Moisés sai novamente e tenta apartar uma confusão entre alguns hebreus. Mesmo tendo cometido um assassinato, Moisés sente-se adequado e em condições de liderar o povo. Porém, pela declaração do hebreu sobre o fato do dia anterior, fica claro para ele que tudo já havia sido descoberto, mesmo ele tendo tentado encobri-lo, enterrando o egípcio na areia. Nossos erros e fracassos estão diante de Deus, mesmo que os tentemos encobrir, mas aí está a Sua misericórdia, no fato de que Deus os usa, quando temos um sincero coração de arrependimento, para nos amoldar à Sua vontade. E Moisés tem que fugir para o deserto (aliás, para detrás do deserto). Porém, é Deus agindo, Ele recebeu a oferta de Moisés para servi-lo e agora vai trabalhar nele. Para isso, é preciso tirá-lo do Egito.
O fato é que muitas vezes nos oferecemos a Deus de forma inadequada, tentando servi-lo na nossa própria força e vontade, mas Deus aceita nossa oferta, quando a fazemos com um coração sincero. Obviamente, não estou incitando a cometermos erros, pensando que os fins justificam os meios, mas, quando desejamos servir, de coração a Deus, Ele nos aceita.
Então, depois do oferecei-vos a Deus, vem o não nos conformemos com este mundo, a partir de onde Deus nos tomará e nos moldará à imagem de Seu Filho. Ao nos oferecermos a Ele, devemos permitir que Ele nos aperfeiçoe, nos fazendo iguais a Cristo. E é o que Deus vai fazer com Moisés.

2º passo: Moisés não se conformando com este mundo
Ao saber que seu crime havia sido descoberto, Moisés foge em direção ao deserto. Porém, creio que, desde o princípio, já era Deus quem estava dirigindo todas as coisas. E Moisés começa, então, a ver o quão inadequado é para a obra de Deus. Ele, que cuidava que Deus iria libertar o povo por suas mãos, agora está fugindo. A Bíblia diz que ele foi parar “detrás do deserto”, provavelmente indicando que ele atravessou todo deserto indo parar no lado contrário ao Egito.
Essa expressão mostra que Moisés foi levado por Deus para longe, muito longe do Egito, seus princípios, diversões, estilo de vida, cultura e sabedoria, tudo o que o lugar mais proeminente da terra na época podia oferecer. Começa então o trabalho de transformação de Moisés, de egípcio em servo de Deus.
O Egito é, claramente, um tipo do mundo e, quando Moisés encontra as mulheres indo pegar água e as livra dos pastores (Êxodo 3:16-19) elas o descrevem como “um egípcio” (v.19). Moisés vestia-se e se portava como um egípcio e estava impregnado da cultura do Egito. É um tipo perfeito de cada um de nós, cristãos que, ao irmos a Cristo, vamos carregados da cultura e dos modismos deste mundo e precisamos ser trabalhados, amoldados, conformados à imagem de Cristo. Ele deve crescer e nós diminuirmos, conforme disse João Batista (João 3:30). E Moisés, para ser o líder que tiraria o povo do Egito, não podia continuar da mesma maneira, um verdadeiro egípcio, mas tinha que ser transformado.
O relato bíblico mostra que Moisés fica morando ali e torna-se um pastor de ovelhas. Que interessante! Se vivêssemos na época de Moisés, rapidamente deduziríamos que ele estava caindo, descendo, de príncipe, filho da filha de faraó, a pastor de ovelhas, uma abominação para os egípcios (Gênesis 46:34). Moisés se torna exatamente aquilo que os egípcios desprezavam e abominavam: um mero pastor de ovelhas. O que é abominável aos olhos de Deus é honrado pelo mundo e o contrário também é verdadeiro. Aquilo que o mundo honra e venera, geralmente é abominável diante de Deus.

3º Passo – Moisés tendo sua mente transformada
Moisés passa quarenta anos de sua vida aprendendo a cuidar das ovelhas de seu sogro, debaixo do sol escaldante, sozinho, atrás do deserto. Era um trabalho do Espírito de Deus, moldando o novo Moisés aos Seus padrões e princípios. Ele havia absorvido, também por quarenta anos, o estilo de vida, conhecimento e cultura dos egípcios e agora precisava ser “desintoxicado” de tudo isso.
É interessante notarmos que Moisés, que havia sido instruído em toda a ciência dos egípcios, poderoso em palavras e obras (Atos 7:22), ao aproximar-se de Deus quando Ele se manifestou na sarça ardente, depois de quarenta anos no deserto, declara nem mesmo saber falar. Ele havia sido despido do velho Moisés, forte e eloquente, para tornar-se o homem mais manso sobre a face da terra (Números 12:3). Que trabalho de Deus. E é isso que Ele deseja fazer conosco ao nos livrar do molde deste mundo. Somos instruídos e trabalhados por Ele para que sejamos como Cristo, e possamos dar testemunho de Seu Filho. E isso é uma grande bênção para cada um de nós.
Ao final dessa etapa, quando Moisés encontra-se com Deus, ele nada mais é do que um pastor de ovelhas, reconhecendo-se inadequado para a obra de Deus. Ele teve sua mente transformada. Ele não pensava mais de si mesmo além do que era verdadeiro (Romanos 12:3), pois Deus havia renovado sua mente, levando-o a considerar-se inadequado para Sua obra. O princípio para um serviço eficaz a Deus reside no fato de o homem saber que, para servi-lo, é necessário compreender que sem Ele nada pode ser feito (João 15:5). E Moisés entende isso. Porém, ele vai além, o que desagrada a Deus. É preciso que entendamos que somos inadequados, mas também devemos compreender que Deus nos torna adequados para Sua obra quando vemos nossa incapacidade. A dependência dele é a base para servi-lo e, quando entendemos isso, devemos nos levantar e servi-lo. O trabalho de Deus em nossas vidas jamais deve gerar uma paralisia espiritual, mas uma vida ativa, andando nas boas obras que Ele mesmo preparou de antemão para que andássemos nelas (Efésios 2:10). Moisés, porém, insiste com Deus que não é capaz – e não era mesmo – porém, o próprio Senhor estava mostrando a Ele que a obra era dele mesmo e que ele o capacitaria a fazê-la. Isso é pensar de nós de forma inadequada. Se Deus nos capacita e manda fazer algo, devemos fazer na força que Ele mesmo provê (Efésios 6:10), do contrário, nós o desonramos dando um testemunho inadequado.
Devemos sempre nos lembrar da parábola dos talentos (Mateus 25), quando o Senhor divide entre seus servos os talentos (dons), um cinco, outro dois e a outro um talento. Cada um recebeu talentos e deveria negociar com eles. Todos têm talentos, alguns cinco, outros dois e outros um, e devemos trabalhar com eles. Os dons são de Deus, não nossos, mas nos foram dados capacitando-nos por Ele mesmo para servi-lo e não podemos enterrá-los. Moisés estava tentando fazer isso, o que gerou a ira de Deus sobre ele, por não entender que era Deus quem o estava capacitando por todo esse tempo no deserto e que a própria forma que o Senhor se revelou a ele, numa chama que ardia sem queimar o arbusto, era um indício de que o fogo de Deus arderia nele, sem consumi-lo. Mas, felizmente, O Senhor o convenceu e ele serviu a Deus como pastor do Seu povo.

4º Passo – Experimentando a boa, agradável e perfeita vontade de Deus
A partir do momento em que Moisés se dobra a Deus e O obedece, ele pode experimentar a boa, agradável e perfeita vontade de Deus e partir para tirar o povo do domínio dos egípcios. Moisés é capacitado com os dons de Deus, a ponto de fazer muitos sinais diante dos egípcios. Ele passa a liderar o povo, o que se torna um trabalho difícil, mas conta, constantemente com a aprovação de Deus.
Os anos no deserto cuidando de ovelhas têm um papel importante nesse novo serviço de Moisés. As ovelhas são difíceis de serem cuidadas, pois são animais tolos e medrosos, podendo ser perturbados por qualquer coisa, além de serem alvos fáceis para os predadores. Não é à toa que a Bíblia nos chama de ovelhas e ao Senhor Jesus, nosso Pastor, pois somos como esses animais. Deus ensinou Moisés a cuidar  de ovelhas e esse conhecimento adquirido, embora agora sejam “ovelhas humanas”, porém igualmente fáceis de serem perturbadas e alvos fáceis do inimigo, o ajudará a liderá-los para dentro da vontade de Deus. E ele cumpriu seu papel, não sem dificuldades. Houve momentos em que Moisés quis desistir, houve mortes, choro, tragédias e incompreensão, até mesmo de seus irmãos de sangue. Mas ele havia aprendido a lição e Deus estava com Ele.
Experimentar a boa, agradável e perfeita vontade de Deus não significa que viveremos num lindo jardim, num mar de rosas, mas que seremos constantemente transformados à imagem de Jesus, nosso Senhor, e, para que isso aconteça, haverá, muitas vezes sofrimento, tristezas e até mesmo perdas, como houve com Moisés. Tudo, porém, com o fim de que sejamos aperfeiçoados, que Cristo cresça em nós para que nós demos um testemunho dele mesmo. Foi assim com Moisés, foi assim com o Senhor, que deixou o esplendor de Sua glória, para morrer, e morte de cruz e não será diferente conosco. (Filipenses 2:5-11). No entanto, o gozo que nos está proposto, a alegria que temos no Espírito Santo, a paz que excede a todo entendimento e a graça que é superabundante, encherão nossos corações, enquanto somos transformados à imagem de Cristo, temos nossas mentes renovadas e nos aproximamos de Deus, servindo-O em nossos espíritos.

Que permitamos a Deus levar-nos para detrás do deserto e nos moldar, transformando-nos e renovando nossas mentes, para que possamos experimentar Sua vontade. Amém!

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